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******************************NÃO contém spoiler*******************************

Autora: Suzanne Collins

Editora: Rocco / Gênero: Distopia / Idioma: Português / 576 páginas

O homem nasce bom e a sociedade que o corrompe ou somos todos inerentemente maus? Uma questão interessante e já bastante discutida nos âmbitos sociais, acadêmicos e literários ao longo dos anos. Seja através de Rousseau ou através de Hobbesdois dos maiores intelectuais que já existiram – a verdade é que não sabemos a resposta para tão enigmática questão. Mergulharmos na leitura de “A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes”, é como debruçarmos sobre um estudo da condição humana, na intenção de tentarmos entender o que nos torna o que somos (maus desde que somos concebidos?). Segundo a perspectiva de Suzanne Collins – autora do fenômeno “Jogos Vorazes” – a sociedade e as situações as quais somos expostos ao longo da vida é que nos transformam nas exemplificações da maldade humana.

Se espera encontrar um livro frenético, repleto de ação e com um personagem que se tornará o herói que procura, sinto em lhe dizer que o mais novo lançamento de Collins talvez não seja uma leitura para você. Focado na juventude do grande vilão da obra – o destestável presidente Snow – a autora tece uma narrativa que tem por objetivo destrinchar um dos personagens mais detestáveis de seu universo. Envolto em política, discussões sociais e apresentando os contrastes da sociedade como um todo, o mais novo romance de “Jogos Vorazes” vai se desenvolvendo de forma a nos colocar no centro das discussões psicológicas e políticas da obra. Nos fazendo adentrar nas incertezas e questionamentos do personagem central, nos colocando frente a frente de seus comportamentos questionáveis que podem ou não vir a responder a emblemática questão: Somos realmente maus por natureza?

“— Exatamente. Acho que ela pensa que somos todos assim. Assassinos por natureza. Inerentemente violentos. Os Jogos Vorazes são um lembrete dos monstros que somos e que precisamos da Capital pra nos proteger do caos.

— Então, além do mundo ser um lugar brutal, as pessoas gostam da brutalidade? […]”

Desenvolver uma narrativa focada em alguém já bastante odiado pelos leitores, não é uma tarefa fácil; e pela coragem e trabalho realizado, tiro o chapéu para a autora. Acompanhar de forma mais aprofundada a jornada e interpéries que podem ter colaborado para que tão importante personagem tenha se tornado quem se tornou, sempre me soou como algo interessante de se analisar. Assim como ocorre em “Wicked” de Gregory Macguire (focado na vilã de “O Mágico de Oz”), em “Sem Coração” de Marissa Meyer (focado na vilã de “Alice no País das Maravilhas”) ou no aclamado filme “Coringa” de Todd Phillips, a vedade é que por mais incômodo que muitas vezes o processo de leitura de obras como essas seja, a mesma é necessária para nos enterdermos, sermos entendidos e nos forçarmos a entendermos e questionarmos a sociedade a qual fazemos parte.

O livro é magnânimo? Longe disso. Por mais interessante que eu considere o viés entregue pela autora e por mais válido que eu considere boa parte do desenvolvimento da obra, “A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes” está bem longe de ser um livro perfeito que irá agradar a todos, seja você fã ou não da trilogia antecessora. As perspectivas de Coriolanus Snow é por diversas vezes repetitivas, cansativas e arrastadas. Muitos personagens coadjuvantes possuem muita superficialidade em seus desenvolvimentos, e diversas problemáticas inseridas não são devidamente trabalhadas (as que envolvem certos personagens e temáticas). As cenas dos “Jogos Vorazes” não possuem dinamismo narrativo (por falta de uma segunda voz narrativa), a personagem feminina apresentada possui um desenvolvimento aquém do esperado e o romance que surge, além de desncessário, não convence. Em contrapartida, o livro se aprofunda nas questões citadas nos parágrafos anteriores, nos obrigando a refletir através de excelentes diálogos e situações. Além de se desenvolver de forma a complementar com maestria a trilogia original.

“[…]

— Sem dúvida, sustenta a visão dela da humanidade — disse Snow. — Principalmente por usar crianças.

— E por quê? — Perguntou o reitor Highbotton.

— Porque atribuimos inocência a elas. E se mesmo os mais inocentes viram assassinos nos Jogos Vorazes, o que isso representa? Que nossa natureza essencial é violenta — explicou Snow.”

“A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes” é o imperfeito perfeito. Uma obra com problemas, mas que por trazer questões tão pertinentes, se torna uma leitura mais que válida. Se somos ou não maus desde que nascemos, a verdade é que o mais novo romance de Suzanne Collins (amado por alguns e detestato por tantos outros) serve como ponta pé inicial para que reflexões e debates do gênero sejam levantadas entre os leitores mais jovens, mesmo que a questão em si possa talvez não ser de fato respondida. A obra tem por objetivo nos desafiar intelectualmente através de uma narrativa que entrega uma “humanidade em seu estado natural.” Uma humanidade despida de qualquer moralidade, empatia ou justificativa que poderia justificá-la como boa. Somos bons ou maus? São questões como essa que fazem livros como esse valerem a pena.

 

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