Depois de muito tempo da estreia e depois de se tornar um dos grandes campeões do Emmy de 2025, resolvi conferir a aclamada e irretocada minisérie Adolescência da Netflix. Descrita como impactante, reflexiva e desconfortável, a mesma nos mergulha em um relato onde a realidade transcende a ficção, sendo daí a origem da mais incômoda experiência que um telespectador pode ter com algo tido como ficcional.
Retratando a jornada de um adolescente que é preso misteriosamente, Adolescência nos leva a reflexões pesadas sobre a importância da família, dos amigos e da inteligência emocional quase inexistente no atual momento em que vivemos. Com planos sequência reais, a série não nos dá tempo para respirarmos, quase como se estivéssemos em tempo real ao lado dos personagens, acompanhando seus desesperos e dilemas diante de uma situação surreal. O espectador não é levado de cena em cena, sendo aliviado com cortes entre uma e outra; mas é mergulhado, quase asfixiado em um ambiente onde a tensão cresce minuto a minuto. A direção, muito inteligente e audaciosa, trabalha o realismo, deixando em cena momentos de falhas percebidas, como excessos respiratórios, olhares desconexos dos atores, gestos e pausas vistas em suas maioria como inatural, mas que aqui, reforça a naturalidade e autenticidade da produção.
Criada por Stephan Graham – também um dos protagonistas – Adolescência causa impacto, desconforto e exige atenção constante. Não é uma série leve e nem irregular. É profunda e o impacto emocional não é evitável. Quase como o irmão gêmeo de Precisamos Falar sobre o Kevin da autora Lionel Shriver, a obra nublada da gigante do streaming se torna ainda mais profunda, quando a verossimilhança vem à tona, colocando a sociedade como juíza e condutora da narrativa, onde vitíma e culpado se mesclam em uma narrativa obscura sobre o poder das redes sociais, destacando o movimento incel que vem crescendo dia a dia, se tornando o mal incontrolável entre os jovens. Nao é uma série fácil de ser assimilada, mas é necessária e deveria ser conferida por todos. De alto nível e psicologicamente incômoda, Adolescência por si só já se justifica em seus primeiros minutos e sustenta com maestria todos os elogios e prêmios que recebeu. Uma obra-prima da ficção e minisséries.
Elenco:
Difícil analisar uma série como essa e não destacar o elenco impecável. Owen Cooper é um gênio que nasce entre os gigantes, sendo impossível não destacar sua atuação como o jovem incompreendido, perdido e perigoso, sendo um trabalho magnífico que cresce episódio a episódio, nos deixando perplexos com as nuances de sua atuação. Stephen Graham e Christine Tremarco, os pais do protagonista, complementam e preenchem a tela com seus trabalhos viscerais, nos entregando tanta verdade, que é quase que inevitável não enxergarmos Adolescência como ficção. Ashley Walters é tão monstruoso que sua atuação cresce mais que o personagem que a carrega, colocando o referido ator acima do enredo, assim como seus pares. Erin Doherty é sem comentários, seus gestos, seus olhares, respirações, postura, tudo digno de uma excelente atriz que interpreta sem medo. No geral, a série é quase sem falhas e as falhas que existem, soam como propositais, elevando ainda mais toda a genialidade desta que é realmente como dizem a crítica especializada, uma jóia entre as grandes do gênero.
Prêmios:
Gotham TV Awards 2025
Melhor série limitada
Melhor atuação principal em série limitada (Stephen Graham)
Melhor atuação coadjuvante em série limitada (Owen Cooper)
Emmy Awards 2025
Melhor minissérie ou antologia
Melhor ator principal em minisséries ou antologia (Stephen Graham)
Melhor ator coadjuvante em missérie ou antologia (Owen Cooper)
Melhor atriz coadjuvante em minissérie ou antologia (Erin Doherty)
Melhor roteiro em minissérie, antologia ou filme para TV (Jack Thorne e Stephen Graham)