Todos os Contos – Clarice Lispector | A Bela e a Fera, dois seres em um ser chamado Clarice.
ResenhasResenhas de Livros 17 de novembro de 2020 Fernando Lafaiete 0
********************************NÃO contém spoiler********************************
Autora: Clarice Lispector
Editora: Rocco / Literatura Nacional / 656 páginas
Reunindo os 85 contos escritos por Lispector (organizados por seu biógrafo Benjamin Moser), Todos os Contos, a elogiada e premiada coletânea – considerada uma das mais importantes da literatura mundial e uma das melhores de 2015, segundo New York Times – apresenta em ordem cronológica os curtos desabafos da autora desde sua juventude até sua fase mais madura. O que nos possibilita acompanharmos passo a passo de sua evolução como escritora, se é que isso é possível. Clarice Lispector se progredia e se regredia todos os dias e a todo momento, o que faz a tarefa de lê-la de fato um exercício de tentar decifrar o indecifrável. Iniciamos com PRIMEIRAS HISTÓRIAS (1940), vamos para LAÇOS DE FAMÍLIA (1960), seguindo para A LEGIÃO ESTRANGEIRA (1964), parando para respirar em FELICIDADE CLANDESTINA (1971), indo para ONDE ESTIVESTE DE NOITE (1974); A VIA CRUCIS DO CORPO (1974) vem logo em seguida… VISÃO DO EXPLENDOR: IMPRESSÕES LEVES nos encaminha para o final que termina com ÚLTIMAS HISTÓRIAS (1979). Oito “coletâneas” excepcionais, singulares, difíceis de serem compreendidas por inteiras, mas magníficas separadas e juntas.
Não se atreva a achar que irá entender tudo que irá ler. O objetivo aqui não é entender palavra por palavra, mas sim em seguir até o final sem medo do que irá encontrar pela frente. É perder o fôlego e recuperá-lo sem se deixar abater. É se desafiar, é se divertir, é rir e chorar. É entrar nesse turbilhão chamado Clarice Lispector, não permitindo ser vencido. Tente dar sentido ao que ler, e entenda que o ser-humano é complexo o suficiente para não ser entendido por inteiro; e isso é fascinante. Clarisse fazia antiliteratura como ela mesma fazia questão de dizer. Escrevia para se libertar, para incomodar e para nos fazer refletir sobre a vida. Mesmo não gostando, era comparada com Virginia Woof. Uma se entregou à vida, a outra deixou de vivê-la… mas ambas entendiam que somos o mais complexos dos complexos que existem por aí, e isso as torna ainda mais incríveis do que já são.
Seja descrevendo de forma verborrágica a cidade de Brasília (conto Brasília), nos levando na epifania de uma mulher que passa a entender o mundo ao seu redor (conto Amor) ou narrando cenas de traições e assassinatos, a verdade é que Lispector era uma escritora completa, capaz de escrever o que quisesse e como quisesse. Se não a entendemos, já não é extamente problema dela. Releituras se fazem necessárias e análises aprodundadas são por vezes essenciais. Todos os Contos de Clarice Lispector é uma obra fundamental para ser lida, estudada e destrinchada. Se debruçar em textos tão intensos é uma tarefa que poucos se permitem, mas que todos deveriam ao menos tentar. Hoje eu sei que se um dia me perguntarem: Quem é Lispector? Eu responderei: A Bela e a Fera em uma única mulher.
[stellar]
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