
Trilogia da Fundação | Isaac Asimov

********************************NÃO contém spoiler********************************
Editora: Aleph / Autor: Isaac Asimov/ Gênero: Ficção-científica / Idioma: Português / 896 páginas
Falar de Fundação – aqui me refiro a toda clássica trilogia de Asimov – é como desbravar um universo único, inteligente e profundo, que agrega e nos desafia a refletirmos sobre os diversos alicerces que sustentam as relações humanas. Não trata-se de um exagero quando muitos afirmam se tratar de uma obra obrigatória para qualquer leitor que se preze, independente de suas preferências literárias. Vencedora do prêmio Hugo em 1966 e eleita a melhor fantasia e melhor ficção científica de todos tempos, a renomada narrativa mergulha em subtextos que muito bem elaborados, sustentam as tramas e subtramas, superando os aspectos clássicos a qual tal romance pertence.
Referenciando a queda do império romano, Isaac Asimov nos intriga, quando em meio a diálogos e situações fantasiosas, nos apresenta um dilema intelectual sagaz que nos acompanhará ao longo das mais de 800 páginas que compõem tão fabulosa ficção. Seria realmente possível através da matemática e da sociologia prevermos os movimentos em massa e com isso nos precavermos quanto a crises políticas e sociais? Com tão audasiosa afirmação – muito mais do que a complexa indagação em si – e com a inserção de um importante personagem, exploramos ao longo de milhares de anos o desenvolvimento de uma sociedade galáctica, que entre conflitos políticos, interesses interpessoais e questionamentos religiosos, se verá em face ao tão polêmico impasse proposto pelo autor: Somos realmente prevísiveis?
Como uma análise científica e teórica, Fundação transpassa os aspectos literários ficcionais e especulativos e se transforma em um verdadeiro estudo do animal Homo Sapiens. Com explanações simples e uma estruturação básica, Asimov nos agracia com uma narrativa acessível, que é complexa sem de fato ser. Com personagens tridimensais e com uma ambientação panorâmica, Fundação é um jogo de xadrez em que as peças se movem graciosamente, em que de um lado estão as ações de seres tidos como racionais, e do outro, probabilidades estatísticas que escancaram o quão simples somos.
Muito eu poderia dizer sobre o suprasumo da fantasia científica e seus meandros narrativos. Mas onde estaria a graça em explanar sobro as diversas curvas narrativas de algo cujo divertimento e desafio estão no processo do leitor em desnudá-las? Com o referido romance, o pai da ficção científica exacerba as mesquinharias, as veleidades e as vaidades dos seres humanos, em passagens que seriam cômicas se trágicas não fossem. Como se toda a trilogia aqui analisada, fosse a caixa de pandora da simplicidade do comportamento humano em conjunto com a construção e descontrução de um povo – em níveis extremos. Destacando sem medo nossas diversas vulnerabilidades quase nulas em sensações e emoções, Isaac Asimov nos entrega de fato uma obra-prima.
O texto narrativo comete apenas o erro de nos apresentar e de nos deixar orfãs de personagens, que aparecem e somem de maneiras abruptas. Mesmo que seus arcos se iniciem e se finalizem de formas plausíveis e consistentes, tal velocidade no contar, não me soou de todo aprazível. No mais, a trilogia Fundação é onde a ficção científica encontra seu auge. É onde Asimov deixa claro nas linhas e entrelinhas o reforço do incômodo em sermos tidos como racionais. É aqui que sua clássica frase faz mais sentido do que nunca: “O aspecto mais triste da vida atual é que a ciência alcança o conhecimento mais rapidamente do que a sociedade alcança a sabedoria”.