*******************************NÃO contém spoiler*******************************
Autora: Shirley Jackson
Editora: SUMA / Genêro: Terror e terror psicológico / 240 páginas
Sendo uma experiência literalmente catártica, encarar uma obra como “A Assombração da Casa da Colina” da elogiada autora Shirley Jackson me foi uma jornada esquisita, incômoda e introspectiva, em que me vi imerso na leitura ao mesmo tempo que me senti desconexo com tudo que a envolvia. Não trata-se de uma narrativa comum em que o terror se enquadra em sua denominação clássica; e tampouco, trata-se de uma narrativa rasa e sem precedentes que justifiquem seu sucesso.
Lançada em 1959, a referida obra faz jus as críticas que recebe dos leitores mais atuais – repleta de personagens infantilizadas e diálogos adolescentizados -, ao mesmo tempo que apresenta traços marcantes de um verdadeiro clássico literário. Shirley Jackson não exagera em suas prospecções sobrenaturais e entrega ao leitor algo muito mais introspecto e psicológico, sendo a obra aqui analisada, um verdadeiro estudo do comportamento humano perante ao que não conhecemos ou que não conseguimos compreender.
A incompreensão do que é apresentado, imerge das personagens e contamina o leitor, transformando as explanações de Jackson em situações distorcidas da realidade e muito mais do que questionáveis. A dualidade ao mesmo tempo que se demonstra como ponto de genialidade da autora, também se destaca como algo que nos exaure mentalmente e emocionalmente. Se seria proposital por parte da escritora, não saberei dizer. Mas que é um dos grandes pontos altos da narrativa, isso é inquestionável.
Muito parecido com o cerne psíquico do aclamado conto “O Papel de Parede Amarelo” de Charlotte Perkins Gilman lançado em 1982, o romance de Shirley Jackson incomoda, causa estranheza e parece sentir orgulho disso. Nos causa sentimento anestésicos e nos faz questionarmos: seríamos animais sensíveis e irracionais, cuja racionalidade que tanto defendemos fosse, na verdade, algo inexistente?
Durante uma de suas entrevistas, a autora faz uma afirmação sobre seu famoso e controverso conto “A Loteria” que descreve e se encaixa também com perfeição sobre “A Assombração da Casa da Colina”:
“Um convite de saciar a necessidade de um comportamento antissocial e depravado (…) de cometer atos gratuitos de violência, de indultar nossos sonhos pueris de poder, de ceder aos nossos medos mais enraizados. Talvez mais do que todo o resto, as histórias de terror (…) dizem estar tudo bem em unir-se ao tropel, em tornar-se um ser tribal, em destruir o forasteiro.”
No mais, em meio a tantas dúvidas e questionamentos que fiz e ainda faço mesmo após o término da leitura, só posso dizer que tudo que sei é que nada sei. Afinal de contas, terminei esta estranha viagem, talvez mais perturbado que as personagens que a compõe.
