******************************NÃO contém spoiler******************************
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Autora: Emily Brontë
Editora: Pé da Letra / Gênero: Literatura gótica – Literatura Inglesa / Idioma: Português / 292 páginas
Existem obras que nos desafiam, nos sugam física e psicologicamente e nos fazem ir a fundo nas camadas literárias que as compõem. Falar de O Morro dos Ventos Uivantes – Wuthering Heights no original – de Emily Brontë, assim como falar de Lolita de Vladimir Nabokov é embarcarmos em uma avalanche de sentimentos, análises e percepções que vão muito além do normal, e que nos impossibilita de ficarmos na superfície de nossas percepções quanto leitores. Afinal de contas, o que faz do clássico inglês de Brontë uma das obras mais desafiadoras já escritas? Considerá-la o paraíso dos psiquiatras seria uma definição audaciosa demais ou deveras unilateral para definir uma obra-prima como o clássico aqui resenhado? Capaz de nos despertar empatia e consternações incontroláveis ao longo da leitura, O Morro dos Ventos Uivantes não deve ser encarado apenas como uma obra de leitura obrigatória e de cunho psicológico. E muito menos como um romance avassalador onde o que iremos acompanhar será uma linda história de amor. Definir a obra de Brönte de forma tão vulgar e simplista seria o mesmo que reduzi-la a algo raso, distorcido em seu real significado e por que não dizer descartável?
“Se o amor dela morresse, eu arrancaria seu coração do peito e beberia seu sangue.”
Como algo quase imortal, devemos tratar O Morro dos Ventos Uivantes como um livro que transcende não somente a época em que foi escrito; como devemos encará-lo como uma história perturbadora, reflexiva, chocante e necessária. Uma verdadeira aula de escrita em sua plenitude, que incomoda, que cansa, mas que não poderia ser diferente em se tratando de uma narrativa focada no lado negativo da digressão do comportamento humano, de forma muito mais impactante do que o que vemos em A Metamorforse de Franz Kafka; outro grande clássico que aborda o mesmo tema por um viés mais metafórico.
Escrito em 1845 e lançado em 1847, o então aclamado romance – um dos mais importantes da literatura inglesa – apresenta com maestria uma narrativa sobre obsessão e vingança, onde que vemos são cenas protagonizadas por alguém que se eternizou como um dos personagens mais enigmáticos e complexos da literatura mundial; Heathcliff, o órfão adotado pela família Earnshaw, que rejeitado por alguns e apaixonado pela irmã de criação (Catherine), desenvolve comportamentos conturbados que desafiam a narrativa e o leitor, se embrenhando e nos forçando a adentrar em uma trama melancólica repleta de reflexões psicológicas e sociais. Se hoje O Morro dos Ventos Uivantes faz parte do panteão da literatura mundial ao lado de outras grandes obras clássicas, sendo considerado quase como uma verdadeira perfeição por grande parte dos críticos literários, devo ressaltar que em sua estreia foi taxado de forma mordaz como um romance exagerado, excessivo e violento. O que não deixa de ser descrições verdadeiras, que antes negativas, agora são vistas como essenciais e os grandes pontos fortes de uma boa (senão excelente) obra psicológica.
“Beije-me uma vez mais, e não me deixe ver seus olhos! Perdoo-lhe o que você me fez. Amo a minha assassina … mas não a sua. Como eu poderia viver sem minha vida? Como eu poderia viver sem minha alma?
De forma bastante cirúrgica, a narrativa de Emily Brontë vai fundo na construção e desenvolvimento dos personagens, apresentando descrições vívidas, assustadoramente palpáveis e que nos sugam para as páginas de forma quase sufocante. Apesar das míseras 292 páginas (na edição que li), o romance me tomou dois meses para ser finalizado e me deixou com dúvidas quanto minha opinião sobre o mesmo. Gosto do romance? Sim e não. Como Lolita, gostei da experiência de lê-lo e afirmo que a escrita tanto de Brontë quanto de Nabokov me deixaram sem palavras. São líricas, fortes, impactam, amortecem e causam impressões irremediáveis. Ler os romances supracitados e se sentir indiferente não é uma opção. O Morro dos Ventos Uivantes é a resposta perfeita para quem se pergunta… “o que faz de um romance um clássico?”. Não é uma leitura fácil, mas é sem sombras de dúvidas essencial. Uma obra sobre obsessão, “amor”, insanidade, digressões comportamentais, remorsos e humanidade. Um livro que me deixou exausto e fascinado na mesma proporção. Quando questionado como defino O Morro dos Ventos Uivantes, sempre repito que o mesmo trata-se de um mar tempestuoso em forma de livro… Se afogar ou não só depende de você leitor.
1 – O romance de Emily Brontë se popularizou entre os jovens por ser o livro preferido de Bella Swan, a protagonista da famosa saga Crepúsculo.
2 – A primeira tradução da obra no Brasil ocorreu em 1938 por Oscar Mendes da Editora Globo. Tradução esta, criticada por trazer mudanças significativas da obra original. Em 1947 tivemos a tradução de Rachel de Queiroz (autora do clássico brasileiro O Quinze), reutilizada em 2010 pela editora Abril.
3 – A obra conta com diversas adaptações tanto para o cinema, série de TV, quanto para o teatro. A mais antiga data de 1920, dirigida por A. V. Bramble e a mais recente em 2011 dirigida por Andrea Arnold.
Olá, adoro o trabalho de vocês! A obra é genial e a sua resenha captou bem isso!
Olá Raquel, tudo bem?
Muito feliz estou de você gostar do nosso site e de ter apreciado a resenha. O mais engraçado é que O Morro dos Ventos Uivantes é o tipo de clássico que eu não sei muito bem se realmente gosto. Mas independente disso, o livro é de fato genial. 🙂