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Robin Hobb, pseudônimo de Margaret Astrid Lindholm Ogden é uma das escritoras mais conceituadas da atualidade quando fantasia é o assunto. Proveniente da Era de Ouro da literatura (período que durou do século XIX até início do século XX), produziu obras que solidificaram o gênero e que a elevaram para um patamar invejado por muitos. Foi neste período que ela criou um mundo incrível conhecido como Reino dos Antigos; mundo este onde se passa duas de suas obras mais elogiadas, a trilogia “A Saga do Assassino” e a trilogia “Mercadores de Navios-Vivos”.
Em “O Navio-Arcano” a autora desenvolve uma trama focada em relações familiares, piratas, navios raros feitos de madeira arcana, capazes de adquirir vida própria, e questões políticas. Com uma trama complexa, a autora narra a jornada de uma jovem que luta em um mundo bastante machista pelo direito de ser capitã do navio-vivo da família. A autora tece uma narrativa bastante envolvente, reforçada pelo mundo muito bem criado e por elementos fantásticos inovadores capazes de instigar e deslumbrar os leitores.
“O Navio Arcano” lançado em 1998 foi considerado pela crítica da época um dos melhores livros de fantasia já escritos. Ao lado de obras como “O Senhor dos Anéis”, “Alice no País das Maravilhas” e “O Feiticeiro de Terramar”, o romance citado é tido como uma preciosidade e um dos pilares do gênero. Gosta de fantasia de alta qualidade? Se sim, o que está esperando para ler esta maravilha?
A trama apresenta um mundo ameaçado por uma guerra iminente entre dois reinos e por serpentes marinhas, criaturas que são o terror dos marinheiros e que além de possuírem capítulos dedicados a elas, ainda trazem um ar de mistério que só colabora para a imersão da leitura. Robin Hobb tem uma escrita fenomenal que sempre me deixa de queixo caído. A autora trabalha bem seus personagens, escreve diálogos de maneira impecável e desenvolve as relações interpessoais com maestria, sempre regadas de aspectos psicológicos muito bem inseridos e sem pesar a mão.
É o quarto livro que leio da autora e posso afirmar sem medo de errar que o primeiro livro dos “Mercadores de Navios-Vivos” é bem superior a trilogia “A Saga do Assassino”, que foi para mim uma leitura bem decepcionante no quesito desenvolvimento e desfecho.
Mas mesmo sabendo das qualidades de “Arcano” e admirando o talento desta grande escritora, devo dizer que para mim não foi um livro excelente. Primeiro: O ritmo narrativo é linear demais. O mesmo possui características narrativas clássicas. Ou seja… não é um livro de fantasia repleto de ação, com reviravoltas e vilões que são a personificação do mal (de maneira literal eu digo). O livro tem 864 páginas e tirando os últimos 5% ele não apresenta um momento de ápice. A lentidão me cansou em alguns momentos e foi um dos motivos para eu não o avaliar com a nota máxima. Segundo: Não gostei dos protagonistas (os mocinhos). Temos Althea, a mocinha injustiçada que se vê traída pela própria família e que a partir daí “lutará” para provar seu valor e reconquistar o que é seu por direito. E temos Wintrow, aprendiz de um monastério, filho do vilão da trama, e que se vê no meio de uma batalha a qual ele não se identifica, além de perder o direito de ser o que ele mais deseja, um sacerdote.
Mas qual o problema destes dois personagens?
Ambos possuem personalidades muito parecidas. Ao invés de raciocinarem e agirem, passam boa parte do romance se lamentando de maneira infinita. Quando decidem tomar uma atitude, não pensam nas adversidades que poderão enfrentar. Agem de maneira muito precipitada e demonstram diversas vezes suas burrices. Eu passei boa parte da leitura me perguntando: como pode um livro com mais de 800 páginas ter dois personagens centrais que não crescem durante o desenvolvimento da trama? Como disse anteriormente, tirando os momentos finais, não senti evolução alguma nesses personagens. Tanta burrice e lamentações fizeram com que eu desejasse que eles morressem. Só fui começar a ter alguma afeição por eles no final. Graças a Deus a autora escolheu a polivalência narrativa e não foca a história apenas nestes dois personagens. Será que com tantas páginas Hobb não poderia ter desenvolvido de maneira mais rápida uma personalidade mais forte para ambos, ao invés de jogar isto para os últimos 4 capítulos? Acredito que sendo tão talentosa, ela poderia ter feito isso sem prejudicar a trama. Acredito inclusive que isto teria ajudado a narrativa, deixando-a mais dinâmica.
Tanta choradeira e brigas em família fazem de “O Navio Arcano” uma novela mexicana. Um livro muito bom e que claramente indico. Mas entendam…. Não esperem ação e personagens ativos. Aqui a coisa caminha devagar, mas o final da jornada termina de maneira bem positiva. Minha experiência de leitura foi como embarcar em um navio e navegar em águas tranquilas sempre esperando o surgimento de uma tempestade. Ela demorou para surgir, mas quando surgiu, me fez perceber que a obra de Robin Hobb não é apenas um livro de fantasia, é um livro superior a maioria e que merece não só ser lido, como merece ser encarado como o que ele é; uma preciosidade em forma de livro.