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Autora: Rory Power / Tradutora: Marcela Filizola
Editora: Galera Record / Gênero: Distopia – Terror YA – Ficção-Científica / Idioma: Português / 320 páginas
Uma nova versão do clássico inglês O Senhor das Moscas? Um romance feminista com pitadas de terror e com representatividade lésbica? Original e eletrizante do começo ao fim, sendo merecedor dos elogios que recebeu em sua estréia no exterior? Primeiramente, antes de adentrarmos a tão importantes questões, devo agradecer as milhares de pessoas que detonaram este livro, que o consideraram mediano ou péssimo e que o classificaram como decepcionante. Considero opiniões negativas extremamente importantes, principalmente por me ajudarem a controlar ou eliminar de vez minhas expectativas; o que quase 100% das vezes me possibilita experiências de leituras mais positivas do que as que eu teria se lesse tais romances esperando grandes coisas. Iniciei a leitura de Meninas Selvagens esperando o pior dos livros; algo que eu fosse detestar ao ponto de despejar minha raiva e minha decepção em uma resenha mais que negativa. E eis que estou aqui para apresentar pontos positivos e negativos de um livro que me divertiu, que desejo uma continuação; e me colocando em uma posição “bem longe de detoná-lo”. Sendo assim, vamos então a primeira questão exposta….
Meninas Selvagens é a versão feminista de Senhor das Moscas de William Golding?
Apesar de ser um defensor ferrenho do feminismo e leitor de obras que abordam tais temas, sei que não é meu lugar de fala. Portanto, devo salientar que o que direi a seguir é a opinião de um alinhado do movimento feminista, um leitor crítico, mas não alguém que entende a fundo o que certas representatividades e situações na literatura pode representar para as mulheres. Sendo assim, devo deixar claro que pra mim uma história precisa de muito mais do que apenas protagonismo feminino para ser considerada feminista. Classificar Meninas Selvagens como feminista é em minha percepção diminuir o movimento e sua importância. Para ser feminista ele precisaria ir muito além do que vai, se aprofundando e problematizando temáticas acerca de tão importante tema. Ele precisaria ser forte o suficiente para se colocar no mesmo patamar de obras ficcionais e femininas como O Conto da Aia, Vox, Hibisco Roxo entre tantas outras narrativas que agregram, trazem reflexões e incomodam; muito mais do que sendo apenas literatura de entretenimento. Nesse quesito já posso dizer que Meninas Selvagens é medíocre.
Sobre ser ou não uma nova versão de Senhor das Moscas, já devo avisar para diminuirem totalmente suas expectativas quanto a este aspecto. Se é fã do tão famoso romance pós-guerra, sua decepção será inevitável. No clássico de Golding temos um grupo de garotos presos em uma ilha, envolvidos em tentativas falhas em se adaptarem e construírem uma sociedade funcional e democrática. Em Meninas Selvagens temos um grupo de garotas presas em uma ilha, enquanto enfrentam uma estranha e desconhecida doença que as domina, as modifica e as desconfigura. A semelhança é óbvia e única… no primeiro, um grupo de meninos; no segundo, um grupo de meninas; e as semelhanças param por aí. Portanto, leiam Meninas Selvagens como uma distopia YA e não como a nova versão do clássico supracitado, e nem como uma estória feminista ou algo do tipo. Tais afirmações não passam de apenas uma jogada de marketing e nada mais além disso.
Meninas Selvagens é terror com representatividade lésbica?
Fiquei apreensivo enquanto lia determinadas partes, mas medo foi algo que passou longe; sendo uma sensação que não senti em momento algum. As partes que poderíamos considerar como terror (com muita boa vontade) são bem fracas e beiram quase como elementos narrativos de literatura infanto-juvenil. A representativa e o romance lésbico prometido pela autora, pela editora e afins, é tão superficial que chega a decepcionar. Então esse é mais um aviso… a representatividade e o romance existem, mas são superficiais.
Mas o livro vale ou não a pena? Do que exatamente fala?
Após os 15% iniciais, já consegui me situar o suficiente para me desprender de qualquer jogada de marketing que o envolvia. O encarei como uma distopia YA, sem grandes pretensões, sendo uma leitura que poderia me divertir se eu a considerasse logo no início como uma trama a se destrichar aos poucos conforme iria acompanhando a jornada da protagonista e de suas duas melhores amigas; que presas em uma ilha, precisam lutar para sobrevirem enquanto encaram a incerteza de um futuro que pra elas parece ser algo impossível de se almejar. Diante de uma doença mortal e cercadas de segredos e de animais descontrolados, as jovens precisam se unir antes que seja tarde demais. Uma trama envolvente, que tem uma boa escrita e boas personagens. Algumas – em especial as coadjuvantes que possuem peso narrativo – são unilaterais demais e por este motivo algumas relações não convencem. Outras são bem trabalhadas, apresentam bons diálogos e cenas de ação interessantes. A ambientação é bacana e o desenvolvimento instiga, o que faz com que devorar Meninas Selvagens não seja uma tarefa tão difícil assim. É um livro que pode ser lido facilmente em dois dias ou até mesmo em um se você for um (a) devorador (a) de livros. Eu curti bastante a leitura apesar das ressalvas… mas o final é o tipo de final que incomoda (como percebi que incomodou muita gente). O desfecho deixa muitas brechas para uma continuação. E digo mais, essa estória precisa urgente de um novo livro. Muitas perguntas a serem respondidas, uma jornada a ser terminada e relações a serem definidas. Muita coisa eu já entendi e muitas coisas me deixaram sedento por mais. Meninas Selvagens tem todos os aspectos possíveis de um primeiro livro de uma trilogia/série, o que infelizmente não encontrei nenhuma confirmação internet a fora.
Meninas Selvagens trata-se de uma obra sobre amizade, aceitação e esperança em meio ao caos. Um livro por vezes genérico, que sofre pela audácia de muitos o compararem ao atemporal e alegórico Senhor das Moscas. Mas que diverte, que flui e que nos deixa com várias pulgas atrás da orelha. Um livro com problemas, que assim como a maioria (para não dizer todos) sofre com as expectativas dos leitores. O encare como uma boa aventura, em que meninas tentam fugir da selvageria do ambiente que as cercam e que como um ser vivo, tudo que deseja é em tranformá-las em mais alguns de seus animais selvagens.
CONFIRA ABAIXO AS RESENHAS DE OUTROS DOIS LIVROS CITADOS NA RESENHA: